Ano muda, mas problemas urgentes não chegam perto de ser resolvidos

Intervenções que melhorem a sensação de Segurança na cidade, a reconstrução de feirões – derrubados nas chuvas de 2016 ainda – a retomada da construção de postos de Saúde paralisados na mudança de gestão e o problema do abastecimento de água são alguns dos problemas que não foram resolvidos em 2017 e, agora, em 2018, seguem importunando anapolino e comprometendo sua qualidade de vida

Henrique Morgantini e Paulo Roberto Belém

O estabelecimento da noção de tempo dividido em períodos, como dias, semanas e anos, serve para nos dar uma forma mais fácil de contar intervalos de tempo, mas – também – para que possamos estipular metas. Em quantos anos eu vou conseguir comprar um carro? Quantos dias faltam para as minhas férias ou quantas semanas faltam para o nascimento do filho?

Assim como em nossas vidas, em que as conquistas pessoais podem ser planejadas, é fundamental abrirmos e fecharmos ciclos. É a conclusão de uma meta estabelecida que nos dá a sensação justa de sucesso, de tentar, lutar e conseguir. O contrário – ou seja, não conseguir o objetivo – também nos traz uma sensação: a de fracasso.

Assim é na vida pessoal, bem como na gestão corporativa e no serviço público. Na administração pública os ciclos são bem definidos: um mandato tem quatro anos e pode ser dividido pelo seu gestor como bem entender. O fato é que, independentemente da esfera de atuação (seja municipal ou estadual), a cidade de Anápolis vem sofrendo com uma série de ciclos que foram abertos, mas que insistem em não se fechar.

A diferença é que a sensação de insucesso vem na vida cotidiana de cada anapolino sob a forma de prejuízo. O prejuízo financeiro do dinheiro público desperdiçado e, principalmente, a falta de qualidade de vida que fica diretamente comprometida quando uma obra não é entregue, quando um benefício não é terminado, quando a água falta na torneira ou quando se anda com medo pelas ruas da cidade.

 Feirões

Um caso emblemático de ciclos abertos que geram prejuízo à população possui dois endereços. As tardes dos dias 4 e 30 dezembro de 2016 ainda não acabaram para os moradores dos bairros Alexandrina e Lourdes. Muito menos terminou para os comerciantes dos feirões que existiam nestas duas regiões e que, por conta de fortíssimos temporais ocorridos, foram derrubados pela força das águas. Foram, ambos, literalmente ao chão, impossibilitando qualquer projeto de reforma. Precisariam ser refeitos, reconstruídos.

O feirante Albertino Rosa dos Santos se lembra bem do que aconteceu naquele domingo de chuva forte em Anápolis no Bairro Alexandrina. “A feira já tinha acabado, estava pronto para ir embora, veio a chuva e na precaução de não molhar as mercadorias que estavam na caminhonete, fiquei lá mais um pouco lá. Só que, de repente, eram umas 14 horas, veio um barulho e o feirão desabou”, relatou.

Feirante Albertino Rosa tem fé que o feirão seja refeito, agora, que é ano eleitoral: ele estava no dia em que estrutura desabou

O “desabar do feirão” foi bem em cima do veículo do feirante que, felizmente, não se machucou. “Corri para debaixo da caminhonete”, contou ele. Acontece que o feirão nunca mais se levantou. Ou melhor: até fevereiro deste 2018 é um destes ciclos abertos que atravessaram todo o ano de 2017 e deve seguir 2018 por um bom tempo. Isto porque a gestão municipal de Roberto Naves (PTB) decidiu não ela mesma reconstruir o patrimônio levado pelas águas, mas transferir a responsabilidade para o Estado de Goiás através da assinatura de um convênio com o programa Goiás na Frente. Só que a matemática é simples: enquanto o dinheiro do Estado não vem, nada  de feirão.

Feira da Alexandrina, atualmente, só sobre a cobertura de tendas, mas mesmo assim, feirantes alegam que chuva atrapalha vendas

No mesmo episódio, agora no Bairro de Lourdes, quem narrou a queda da estrutura do feirão do bairro foi o comerciante Joel Generoso. “Foi uma tragédia, mas, felizmente, ninguém se feriu”, conta. A “solução” encontrada foi a mesma: transferir a responsabilidade para uma parceria. Enquanto não se materializa o convênio, o feirão não brota do chão. Hoje, a feira do local acontece bem na avenida que circunda o espaço do feirão, o que revolta os comerciantes. Em dia de chuva é praticamente impossível para os fregueses realizarem suas compras.

Revolta

“Estamos à mercê da Prefeitura. A verba já saiu e falta a tal licitação. O prefeito tem que ter uma iniciativa”, disse Joel, do Bairro de Lourdes. A verba que o comerciante se refere é aquela, relacionada aos recursos do programa Goiás na Frente.

Estes recursos foram prometidos em junho de 2017 e informações dão conta de que só agora, em janeiro passado, saíram as primeiras parcelas do convênio. Consultada, a Prefeitura não quis se pronunciar sobre como está o procedimento o que torna impossível prever à população expectativas pela reconstrução dos feirões.

Sobre essa expectativa, o feirante Albertino enxerga que é possível que o da Alexandrina seja reconstruído ainda em 2018 só por conta do ano eleitoral. “Como a verba é do Estado, eles vão querer fazer isso aqui sim”, acredita. O feirante faz outra análise. “Se fosse por conta da Prefeitura, não tinha esperança”, citou. Já para o comerciante Joel, a Prefeitura poderia, sim, bancar a obra com recursos próprios. “Pela verba que entra nos cofres da Prefeitura, se o prefeito bem quisesse, ele tiraria isso de letra”, pontou.

O comentário de Joel bate com o anúncio da própria Prefeitura. De acordo com o prefeito Roberto Naves, somente nos dois primeiros quadrimestres, a gestão municipal teve um superávit (lucro) superior a R$ 76 milhões. O projeto para erguer os feirões gira em torno de 5% disto.

O comerciante Joel Generoso acredita que se fosse vontade do prefeito Roberto Naves, feirão do Bairro de Lourdes já teria sido reconstruído

Transposição do Capivari para o Piancó: anunciada em junho, prevista para setembro, prorrogada a outubro e inacabada até hoje

Se os feirões caíram por conta das águas das chuvas, o tema da água é causador de mais dor de cabeça. Desta vez, ironicamente, pela sua escassez. Problema que atinge a um número muito maior de pessoas, a falta de abastecimento de água neste ano começou até mesmo antes do período das secas, propriamente ditas.

Obras da transposição do Rio Capivari ainda não ficam prontas: previsão renovada desde setembro

Se Roberto Naves – ainda como Roberto do Órion – prometeu por fim ao problema com a municipalização do serviço, com o passar do tempo, não aconteceu nem uma coisa nem outra: o serviço nem passou perto de ser municipalizado como prometeu, e muito menos deixou de ser escasso e falho nas torneiras anapolinas.

O prefeito optou por realizar uma parceria – de novo – com o Governo de Goiás e lançou em junho de 2017 um projeto de transposição de águas de um rio para um córrego que, segundo o governador Marconi Perillo e o prefeito Roberto Naves, poriam fim ao problema de falta de água

Ainda não é possível afirmar ou questionar se a obra vai mesmo por fim à falta de água por um simples motivo: quem não teve fim até agora foi a obra. Prometida para encerrar em setembro, foi prorrogada para outubro e, depois, novembro. Agora, em fevereiro do ano seguinte, a obra segue inacabada e com a promessa em aberto: ela irá findar os problemas de água da cidade.

Aquele 1%

A explicação é que, ironicamente, foi a água quem prejudicou a obra. A gerente da Saneago em Anápolis, Tânia Valeriano, alega que por conta da chegada do período chuvoso, entre o final de novembro e início de dezembro de 2017, a obra deixou de ser uma prioridade. “Houve esta tranquilidade por conta da não urgência da obra naquele momento, o que seria diferente se a seca tivesse continuado”, disse. Tânia assegura que a obra está em andamento e que falta muito pouco para ser finalizada. “Está em 99%”, sugere.

Tânia Valeriano, da Saneago, admite que obra deixou de ser prioridade com a vinda das chuvas, mas deu novo prazo: 16 de fevereiro

O que falta, segundo a gerente, é a finalização da última travessia da obra, chamada de “não destrutiva”, que passa sob a BR-414, mais próximo à captação na qual será colocada a bomba. Tânia informou que a bomba só será levada para o local quando tudo estiver pronto para testes porque não haverá a necessidade de deixá-la “estacionada” no local. “Como a gente só vai utilizar em período de estiagem, a gente a remove”, explica. Perguntada sobre data de inauguração da obra, a gente arremata. “16 de fevereiro”.

Homicídios aumentam 40% em janeiro de 2018

De todos os ciclos abertos e não fechados, o mais preocupante deles é – de longe – a escalada da violência cotidiana anapolina. O grande marco deste tema é, sem dúvidas, o número de homicídios registrados na cidade ao longo de 2017. A ausência de uma ação que represente um procedimento diferente do que vem sendo feito cria um cenário de repetição, ou seja: 2018 começa como 2017 terminou, com a contagem dos corpos de pessoas – em sua maioria jovens – mortas pelas razões mais variadas.

O mês de janeiro que se encerrou na última quarta-feira (31) contabilizou 21 homicídios em Anápolis. O mesmo mês de 2017 contabilizou 15 homicídios. Um aumento de 40%. Se a média de 20 assassinatos for considerada até o fim deste ano, Anápolis passará dos 200 homicídios em 2018. É claro que ninguém quer que essa previsão se concretize, mas é preciso analisar: será que a política de prevenção preventiva para coibir estes crimes em 2018 deve ser a mesma aplicada em 2017?

Assassinato de mãe e filha já é um dos piores casos deste ano

Porque se for, mais pessoas sofrerão com a perda de entes queridos, a exemplo das famílias que perderam os jovens no triplo homicídio contra Leandro Vicente, Filipy Nunes e Rodrigo Ferreira. O crime completa um ano neste final de semana e ainda é um mistério para a Polícia.

Recentemente, o duplo homicídio contra a jovem Laura Alves e a sua filha Eloá de apenas oito dias de vida no dia 24 de janeiro último, também pede a adoção de estratégias que visem evitar este tipo de crime na cidade.

Prevenção

Comandando o 3º Comando Regional da Polícia Militar desde junho passado, o tenente coronel João Batista de Freitas disse que essa política preventiva tem sido repensada desde a sua posse e que isso fez com que o número de homicídios reduzisse 14% no comparativo de 2016 para 2017. Entretanto, ele reconhece que esta mesma política precisa, agora, ser reforçada. “A dificuldade maior está nos homicídios passionais, imprevisíveis, que ocorrem em ambiente interno”, ressalta.

Segundo o comandante, o reforço da segurança virá com o incremento da presença da Polícia Militar em locais de risco. “E digo que não seja só as bocas-de-fumo, mas também na fiscalização dos entregadores, nesse comércio ilegal”, pontua. Freitas garante que as abordagens serão intensificadas e dinâmicas.

Comandante do 3º CRPM, Coronel Freitas promete aumentar a presença da Polícia nas ruas e afirma que Guarda Municipal, se sair, ajuda

Para Freitas, a implantação da Guarda Municipal pode ser decisiva na contribuição municipal para a Segurança Pública. “Toda ajuda é válida”, anuncia. No entanto, nem mesmo Freitas tem muita esperança que esta ajuda aconteça em um período breve de tempo. “Todo o trabalho em relação a parcerias é importante. Seja GGIM, CMTT ou a Guarda Municipal, se é que ela vai ser implantada”, concluiu.

A desconfiança do comandante tem sua razão de existir: prometida na campanha, não saiu nem mesmo da ideia para o papel em 2017, isto é, nem mesmo foi apresentada como projeto para ser debatido com a sociedade e com a Câmara Municipal. A dúvida incrédula de Freitas é: quando ela, enfim, sairá do papel e ganhará as ruas?

Líder do prefeito afirma vigias estão “emperrando” Guarda Municipal

Líder do prefeito na Câmara, Jakson Charles (PSB) disse que que o projeto da Guarda Municipal já está pronto, mas que o questionamento dos vigias quanto ao aproveitamento deles na nova carreira é o que está “emperrando” o prosseguimento do processo. Segundo Charles, alguns vigias sustentam que podem ser aproveitados na Guarda Municipal. “Não há resistência de aproveitamento deles, caso isso seja legal, mas, a priori, um estudo prévio já exclui essa possibilidade”, divulgou.

Líder do prefeito, Jakson Charles, justifica não implementação da Guarda Municipal, uma das principais promessas de campanha de Roberto Naves (PTB)

De acordo o líder, a resposta a esse questionamento está a cargo da Procuradoria Geral do Município, mas que o órgão não definiu data para divulgar esse parecer. “Independente disso, eu acredito na realização do concurso para a Guarda Municipal ainda no primeiro semestre”, concluiu, atribuindo que, depois disto, qualquer atraso na efetivação da Guarda virá por questões burocráticas. “O desejo do prefeito é colocar o projeto em prática ainda esse ano”, finalizou.

Na Saúde, duas das cinco obras são retomadas, mas nenhuma ainda tem previsão de entrega

Em março de 2017, A Voz de Anápolis abordou as obras paradas na área da Saúde que foram herdadas pela atual administração. Na lista, cinco Unidades Básicas de Saúde com estágio de obras variado: Arco Íris (70%), Leblon (15%), Parque Iracema (80%), Parque Residencial das Flores (55%) e Tropical (40%). Atualmente, o cenário é o seguinte: apesar de ter reassumido há meses a obra do Parque Iracema e, mais recentemente, a obra do residencial Arco Íris, o prefeito Roberto Naves (PTB) ainda não conseguiu entregar à população nenhuma obra de postos de saúde que foram assumidas por sua gestão.

É justamente este “passar do tempo” que frustra os moradores das diferentes regiões em que os esqueletos de postos de saúde estão localizados. Situação mais grave para as obras que ainda continuam abandonadas, sem qualquer movimentação de trabalhadores.

É o caso da obra da Unidade Básica de Saúde do Setor Tropical. Quem conhece esta situação é a dona de casa Silma Maria de Almeida. “Sou a referência local dessa obra parada. Toda equipe de reportagem bate no meu portão para perguntar disso aí”, afirma Silma, apontando com desdém e revolta para a obra.

Dona de casa ainda exibiu o abandono da obra do Tropical: “Todo mundo me pergunta disso aí”

Situação

A dona de casa disse que se recorda bem de quando a obra foi iniciada, mas que o pior, para ela, foi quando percebeu que houve a paralisação das atividades no local. “Uma obra demorada, tudo bem! Mas quando para, é aí que a gente pensa: e agora?”, denota. De dentro do que poderia ser o posto de saúde do Tropical é que ela aponta os prejuízos que a obra parada traz para a comunidade próxima. “É mato, é sujeira, é vasilha que acumula água, é esconderijo para bandidos”, relata.

Mas o prejuízo principal, segundo ela, é falta que o posto de saúde faz para ela e para a sua família. Ela fala isso ao lado dos netos menores que, de acordo com a dona de casa, são os mais prejudicados. “Deixo de ir aqui em frente, para andar longe”, diz ela, informando que a unidade de saúde mais próxima é a do Bairro de Lourdes. “E olha que lá você nem sempre é atendido”, levanta.

Andou, mas parou

Perto do Setor Tropical, outro exemplo de obra de posto de saúde sem qualquer movimentação, a do Residencial Leblon. Entretanto, diferente da situação de março de 2017, a obra teve avanço. Quem confirmou a informação foi a também dona de casa Lucilene Castilho. “Em 2017, a obra andou um pouco, mas a situação é essa: parou de novo”. Quem abordou a reportagem foi a própria dona de casa que estava acompanhada da pequena Raíssa, um bebê de três meses.

Ela tinha acabado de caminhar por uma hora sob sol forte voltando do posto de saúde do setor mais próximo, o Alvorada. “Vi vocês aqui e pensei: deve ser por causa do posto de saúde”, citou. Para Lucilene, a falta da unidade concluída faz com que a comunidade do Leblon perca tempo. “Para ser atendida lá no Alvorada, tive que sair de casa às 9 da manhã. Se fosse aqui (no Leblon), resolveria minha situação em bem menos tempo”. E complementa. “E quando lá não está lotado, é caminhada perdida”.

Para Lucilene Castilho, falta da unidade concluída faz com que a comunidade do Leblon perca tempo

Sem prazos

A reportagem entrou em contato com a Prefeitura questionando as datas de entrega dos postos de saúde do Parque Iracema e do Residencial Arco Íris e também questionando se existia data prevista para que as unidades que ainda continuam abandonadas tenham as obras retomadas, entretanto, a assessoria da Prefeitura disse que não iria se pronunciar sobre o assunto.

Entre essas duas que foram retomadas, visualmente, a mais avançada é a do Parque Iracema que aparentemente deve ser entregue à população em breve. Mesmo assim, a Prefeitura preferiu omitir a informação quando provocada pela reportagem.

Unidade parece estar quase pronta, mas Prefeitura omite data de inauguração

 

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