Em editorial, Estadão critica “obsessão” da Lavajato pela delação premiada em prisão de Geddel Vieira

O Editorial da edição desta quarta-feira (05) do jornal Estado de S. Paulo criticou a postura adotada por juízes envolvidos nos processos relacionados à Lavajato e ao combate à corrupção quanto ao uso da delação premiada. Ao analisar o caso da prisão de Geddel Vieira, a publicação mostra que ao invés de cumprir a lei em sua essência em um acusado recorrente de crimes “desde os 25 anos de idade”, usa a prisão para forçar o ex-ministro a promover uma delação premiada.

Para o editorial, há uma “inversão” dos valores da aplicação da lei. “Diante de um caso grave assim, era de esperar um estrito cumprimento do processo penal. No entanto, a leitura da decisão da 10.ª Vara Federal do DF revela uma perigosa interpretação da lei e da delação premiada, que, em última análise, afeta as garantias individuais de todos os cidadãos”.

“Ao aplicar a lei dessa forma, entendendo que uma conversa sobre possível delação de um réu é sinônimo de obstrução da Justiça, o juiz inverte a lógica da delação premiada, como se a obtenção de um acordo de colaboração com a Justiça fosse um direito inexorável do Estado. Se, como é óbvio, não cabe às autoridades exigir a realização de um acordo de delação premiada, não se pode criminalizar toda e qualquer ação que tente impedir uma delação”, afirma outro trecho.

 

Acompanhe trechos do editorial:

 

“Como todo acordo jurídico, o termo de colaboração premiada pressupõe a liberdade entre as partes. E se cada um é livre para ponderar se deve ou não fazer um acordo de delação premiada, também é igualmente livre para receber conselhos, sugestões e ponderações de quem quer que seja. Em sentido estrito, a interpretação da lei que baseia a ordem de prisão de Geddel conduz a uma criminalização da liberdade de expressão.

 

Logicamente, qualquer tipo de coerção é ilegal. Caracteriza uma violação da liberdade individual, a merecer pronta atuação do Estado. No entanto, as autoridades persecutórias, Polícia Federal e Ministério Público, precisam provar a existência dessa eventual coação. Uma conversa não é, necessária e automaticamente, uma coerção.

 

No caso em questão, até o juiz admite a falta de provas de uma eventual coação, pois na mesma decisão que manda prender o sr. Geddel autoriza a apreensão dos celulares do político “pela necessidade de buscar elementos quanto à sua atuação (…) no que pertine a contatos com a esposa do réu Lúcio Funaro e investigado na Operação Cui Bono”. Ora, atirar antes e perguntar depois não é uma boa forma de conduzir processo penal.

 

Seria equívoco não pequeno se o desejo de combater a corrupção e a impunidade levasse a um descarte paulatino da lógica e das garantias do processo penal. A delação premiada deve ser instrumento de auxílio à Justiça, e não uma obsessão que faz inverter o ônus da prova, excluir a presunção de inocência e transigir com as condições para a prisão.

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