Médicos migram para Mais Médicos e deixam vagas abertas em Goiás

Pelo menos 62% dos 202 profissionais selecionados pelo Ministério da Saúde para preencher as vagas dos cubanos em Goiás do programa Mais Médicos já possuem algum vínculo com o Sistema Único de Saúde (SUS), sendo que 33,6% atuam no Estratégia Saúde da Família (ESF) pelas prefeituras e terão que se desligar do cargo para assumir a vaga no programa. Apenas 70 profissionais interessados nas vagas não estavam contratados pelo poder público. Houve seis casos que a reportagem não conseguiu identificar esta relação.

Levantamento feito pelo  jornal O POPULAR cruzando a lista de selecionados para esta etapa do Mais Médicos com o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (Cnes) do Ministério da Saúde mostra que, além dos 68 médicos que terão de abandonar as vagas nas quais estão lotados no ESF pelas prefeituras, há outros 52 casos em que os profissionais trabalham para a rede pública em cidades diferentes das quais foram selecionados ou até mesmos outros Estados.

Relatório elaborado pelo Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Goiás (Cosems-GO) mostra um quadro ainda pior, com 104 médicos selecionados já atuando no ESF até outubro e apenas 42 sem nenhum vínculo com o SUS. Ainda de acordo com este documento, 21,2% dos 202 convocados pelo Ministério da Saúde para Goiás têm contratos que somam 60 horas semanais de trabalho e 7% com vínculo de 24 horas.

O profissional selecionado para o Mais Médicos pode conciliar o trabalho no programa com outros cargos públicos desde que não haja incompatibilidade com a carga horária exigida pelo programa (40 horas semanais, sendo 32 horas atuando na unidade de saúde). Entretanto, há casos em que médicos atuam na rede pública em cidades distantes do local para onde foram alocados.

A reportagem apurou que alguns dos selecionados já procuraram as prefeituras para flexibilizar o horário de trabalho, podendo ir para a cidade apenas um ou dois dias por semana. Um dos profissionais é diretor de um hospital local. Há também um médico residente de São Paulo que já teria dito à administração municipal que ficará no cargo apenas até março.

O impacto da migração dos profissionais com vínculo com as prefeituras para o Mais Médicos ainda não foi totalmente calculado pelo Cosems-GO, mas é realidade no País. O jornal O Estado de S. Paulo mostrou que em outros 13 Estados, os conselhos locais levantaram que 58% dos selecionados apenas migraram de uma unidade de saúde para outra, provocando o desfalque.

Preocupação

O Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasens) já se reuniu com o Ministério da Saúde para buscar uma solução para o problema. Existe uma preocupação que o preenchimento das vagas do Mais Médicos represente uma desorganização no sistema de saúde municipal, principalmente em prefeituras que não foram atendidas pelo edital.

É o caso, por exemplo, de Itapaci, que não está inscrita no programa, mas por outro lado vai perder três profissionais do ESF que estão mudando de cidade para atuar no Mais Médicos.

O prefeito Mário José Salles (PSDB) afirmou que não inscreveu a cidade porque estava “inseguro”. “Fiquei inseguro com o programa, porque não conheço esse povo que vem para cá. Mas agora eu vou habilitar para entrar”, disse.

Itapaci possui 13 médicos, sendo 6 da ESF. Desses, 3 estariam saindo. A secretária de Saúde Taisa Duarte Bastos disse que uma médica que se inscreveu no programa não irá embora, mas a reportagem não conseguiu contatá-la. Taisa afirma que irá abrir credenciamento para ocupar as vagas no próximo mês.

A presidente do Cosems-GO, Gercilene Ferreira, diz que os profissionais que estão trocando de vínculo são atraídos por melhores salários, um contrato mais estável e com o governo federal e outras vantagens, como ajuda de custo ou uma carga horária menor de trabalho. “Só estamos esperando os profissionais se acomodarem para tomar ver as providências. O Conasems já começou a discussão com o Ministério da Saúde.”

A reportagem procurou o Ministério da Saúde para saber se haveria alguma providência em relação às vagas que ficariam abertas com a migração registrada, mas até o fechamento da edição não houve resposta.

Estabilidade e férias estão entre os atrativos

Profissionais que estão deixando cargos em prefeituras para atuar pelo Programa Mais Médicos relatam a estabilidade como principal motivo para a mudança. Neste cenário, o município de Cidade Ocidental está perdendo quatro médicos, sendo que dois atuam no Estratégia de Saúde da Família (ESF).

Uma das médicas é Patrícia dos Santos Massanaro, que tinha contrato temporário na prefeitura e agora atuará pelo programa em Valparaíso. A profissional relata que com os descontos, acabava recebendo menos na cidade do que o valor que receberá pelo programa. Ela também viu como atraente o fato de que terá férias e um dia na semana para capacitação. “Tem suporte, orientação e estabilidade de atuar por três anos na mesma equipe”, comentou.

A médica, formada há um ano, diz que pretende continuar trabalhando na área de Saúde da Família. A coordenadora de Atenção Básica em Cidade Ocidental, Patrícia Vieira, explicou que já foi aberto processo seletivo para que as duas vagas sejam preenchidas em janeiro. O município tem 19 equipes de ESF, em 13 unidades.

De acordo com ela, outras equipes absorverão os pacientes deixados pelos dois profissionais neste fim de ano. O município está recebendo também seis médicos pelo programa, preenchendo as vagas deixadas por seis cubanos.

Em Itapaci, três médicos estariam deixando a cidade para atuar pelo programa em outros municípios. Um deles é Carlos Eduardo Machado Moreira de Melo, que irá para São Luiz do Norte. Formado há dois anos, ele relata as mesmas questões apontadas por Patrícia. “A classe médica pede segurança; pede para ter no mínimo os direitos trabalhistas, como férias”, conta. O médico, que também tinha contrato temporário na cidade, diz que esta é a terceira vez que se inscreve no programa, mas nas outras não foi aceito. (O Popular)

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