Números da Violência: 2017, um ano para ser apagado, mas jamais esquecido

Além do alto número de homicídios e crimes violentos na cidade, população declara que falta de policiamento e do cumprimento de demais promessas do poder público contribuem para o aumento da criminalidade: confira o mapa da violência na cidade

Felipe Homsi

2017 vem sendo comemorado por autoridades como um ano positivo, já que o número de homicídios em Anápolis caiu 12% no comparativo com o ano passado, se forem considerados apenas os dados de janeiro a outubro. Neste ano, foram, até outubro, 141 mortes do gênero, conforme informações do Grupo de Investigação de Homicídios. Em 2016, o número tinha chegado a 161 em outubro. Mas há realmente o que comemorar?

A população dirá que não. 2017 ficará marcado na memória dos anapolinos como o ano em que o Governo Estadual resolveu presentear Anápolis com 600 presos do Complexo Penitenciário Odenir Guimarães, episódio que revelou a falência do sistema penitenciário estadual, que protela, ano após ano, a inauguração do Novo Presídio, que foi usado para abrigar detentos de todas as classificações, com uma estrutura precária, já que a unidade nem havia sido inaugurada. Durante o período de permanência dos presos, a sensação de medo se espalhou pela cidade.

Os números assombram. O relatório do Hospital de Urgências de Anápolis aponta que no ano de 2016, até dezembro, foram 671 atendimentos por acidentes com arma de fogo. Já em 2017, que nem terminou, até outubro já havia o registro de 712 ocorrências. Segundo as polícias militar e civil e até especialistas que atuam no Hospital de Urgências de Anápolis, isto pode significar que várias mortes decorrentes de disparos de arma de fogo ocorreram depois de crimes cometidos na cidade.

Números

Ocorre que, por força de normativas estaduais de Segurança Pública, estes crimes nem sempre são investigados como homicídio. Se uma vítima de disparo morreu, três semanas depois, por hemorragia, mesmo que causada pelo tiro, a causa mortis será descrita como o último quadro de saúde da pessoa, e não como o modo em que ela chegou ao hospital.

Alguns especialistas acreditam que as estatísticas poderiam até mesmo dobrar com relação ao número de homicídios, se se considerasse o fato violento original que levou determinada pessoa ao hospital. Atendimentos por acidentes com arma branca não tiveram alteração significativa nos dois anos. Em 2016, foram 518 e em 2017, 508.

Os números de homicídios divulgados pela Polícia Civil não levam em conta os latrocínios – roubos seguidos de morte – e mortes em confrontos com policiais. Alguns representantes da imprensa anapolina que cobrem crimes violentos e administradores de grupos de notícias de Whatsapp levam em consideração estes tipos de ocorrência na contagem das mortes violentas. De acordo com estas pessoas, o número de homicídios em Anápolis se aproxima das 170 mortes.

Mapa

Conforme informações repassadas pelo delegado Renato Rodrigues de Oliveira, titular do Grupo de Investigações de Homicídios de Anápolis, 52% das pessoas mortas em homicídios têm menos de 30 anos de idade. Pelos estudos estatísticos da corporação, já é possível estabelecer o “mapa de calor e o mapa de pontos” que indicam os principais bairros onde ocorrem homicídios.

Renato Oliveira, titular da GIH, acredita que é necessário maior efetivo para que o índice de resolução de homicídios aumente em Anápolis

O Centro (6), a Vila Jaiara (5), a Zona Rural (5), Calixtolândia (4), Frei Eustáquio (4), Jardim Arco Verde (4), Jardim Esperança (4), Jundiaí (4), Residencial Copacabana (4), Vila Santa Isabel (4) e Vila São Joaquim (4) lideram a lista destas mortes violentas. Ele pontuou que a resolução dos crimes de homicídio chega a 40%, o que é baixo, mas pode ser melhorado caso sejam disponibilizados novos delegados e agentes para compor o quadro da Polícia Civil. Ele destaca o alto índice de prisões de indivíduos que cometeram homicídios. 60 pessoas foram presas, conforme pontuou.

 

Mapas de calor e de pontos destacam áreas de Anápolis onde os homicídios são mais frequentes

Diretor e chefe de segurança da Cadeia Pública são presos por “vender” cervejas e festas a presos

Paulo Roberto Belém

Os assuntos “cadeia pública” e “novo presídio” foram os que mais predominaram as discussões quando levada em conta a situação carcerária de Anápolis em 2017. Entre um e outro, mandos e desmandos. E neste intervalo, um episódio recente revelou o novo quadro que envolve estes dois temas: o da corrupção. Na última terça-feira, 21, a cúpula gestora da Cadeia Pública de Anápolis, entre eles, o diretor da unidade, Fábio de Oliveira Santos, e o chefe de segurança, Ednaldo Monteiro, foi presa após deflagração da Operação Regalia pelo Ministério Público.

O agora ex-diretor da Cadeia de Anápolis, Fábio de Oliveira Santos, no momento de sua prisão (Foto: Reprodução TV/Anhanguera)

O MP, após meses de investigação, chegou à conclusão de que estes dois servidores encabeçavam um esquema que cobrava altas quantias em propina dos presos encarcerados para que eles tivessem “regalias” dentro da unidade. Àqueles que tinham condições de bancar a propina aos acusados, uma situação bem diferente à dos demais presos. Cenário que, às vezes, era melhor que o de pessoas inocentes que vivem por de trás das grades e que não se beneficiam com o crime.

Regalias

Entre as regalias denunciadas e documentadas pelo MP, acredite: uso do celular, consumo de bebidas alcoólicas, pizzas, drogas, saídas para festas na região e outras saídas aleatórias. Tudo isso com o consentimento da direção da cadeia. O MP também divulgou uma imagem do que seria o “motel particular” dos presos que funcionava dentro da Cadeia de Anápolis. Nessa sala, os presos corruptores que se submetiam a bancar as propinas teriam direito a usufruí-la. Até um caderno em que constava o contato de “garotas” foi notado.

Presos corruptores tinham à disposição um motel dentro da Cadeia (Foto: Divulgação MP)

As investigações foram instruídas com o anexo de várias informações e arquivos probatórios. Em um determinado documento que integra o dossiê do caso, há a referência de que para que o preso pudesse usufruir indiscriminadamente o celular dentro da Cadeia Pública de Anápolis, ele teria de pagar uma mensalidade de R$ 1 mil aos acusados. Já o preso que porventura quisesse tomar “aquela gelada”, este teria que desembolsar R$ 30 – o valor é 10 vezes maior do que o cobrado em estabelecimentos comerciais na cidade.

Prisão temporária

O Ministério Público informou à reportagem que o prazo da prisão temporária dos presos vence neste domingo, 26, mas que os promotores podem pedir a renovação da prisão de caráter temporário ou optar pela prisão preventiva, caso entendam que os acusados ofereçam risco ao curso das investigações. Até o fechamento desta edição, o MP não havia confirmado se Fábio de Oliveira Santos e Ednaldo Monteiro haviam prestado depoimento.

Agentes da Polícia Civil fizeram uma varredura na Cadeia Pública de Anápolis (Foto: Divulgação MP)

Já na quarta-feira, 22, o novo diretor da Cadeia Pública de Anápolis já comanda a unidade. Na direção está, agora, Leandro Ezequiel. Ele foi indicado pelo superintendente executivo da Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária, o tenente-coronel Newton Castilho. O presidente do Conselho da Comunidade na Execução Penal em Anápolis, o advogado Gilmar Alves dos Santos, informou à reportagem que já se encontrou com a nova direção da cadeia para discutir sobre a gestão dos projetos que o conselho mantém na unidade. “Ele me assegurou a permanência do trabalho que já desenvolvemos, mas entendo uma nova gestão vai ser dada àquela unidade”, disse.

Relembre os casos que marcaram a cidade

Bairros considerados nobres, cujos moradores pagam altos montantes em impostos, não escaparam da escalada violenta deste ano. Donato Gontijo, de 27 anos, foi morto dentro de casa no dia 5 de fevereiro, um domingo, durante um assalto no bairro Jundiaí. De acordo com a família, ninguém reagiu, mas mesmo assim um assaltante atirou e atingiu a vítima na cabeça. Segundo o pai de Donato, o comerciante Douglas Gontijo, três homens armados invadiram a residência, exigiram dinheiro e alguns pertences da família.

Donato Gontijo foi morto em sua casa, no Bairro Jundiaí, durante assalto

No mesmo mês em que Gontijo morreu assassinado, três jovens haviam sido mortos no último final de semana. No primeiro deles, o triplo homicídio de Leandro Vicente, Filipy Nunes e Rodrigo Ferreira, encontrados mortos em diferentes regiões da cidade. Os três jovens foram abordados juntos na casa de Filipy, no dia 3 de fevereiro. Eles foram executados em locais distintos, todos na mesma noite. Filipy era o único com passagem na polícia.

Triplo homicídio, também em fevereiro, ainda é um mistério

No dia 26 de fevereiro, a jovem Emanuelle, de 21 anos, foi assassinada brutalmente após uma festa. Nascida Rômulo Castanheira, ela estava em processo de transição para a realização da redesignação sexual, a chamada “mudança de sexo”, e já adotava o nome de mulher nos lugares que frequentava.

Caso Emanuelle: assassinos confessos estão presos

Nos dias 3 e 4 de abril, quatro homicídios ocorreram na cidade, nos setores Copacabana, Campos Elísios, Paraíso e Vila Formosa. Em todos os casos, homens com idade entre 20 e 30 anos foram vítimas de arma de fogo.

Os principais homicídios ocorridos em 2017 na cidade envolveram histórias de paixão, vingança, execuções por dívidas, motivos banais e até mesmo queima de arquivo. No dia 6 de abril uma quinta-feira, a jovem Rayane Araújo Silva foi executada, um crime passional cometido pelo seu ex-namorado, Daniel Hermes Pinto, que se entregou à polícia no dia seguinte. Rayane era estudante de farmácia e atuava como analista de processos em uma indústria farmacêutica no Distrito Agroindustrial de Anápolis. O que intrigou a população foi o horário e o local do crime. Às 9 horas, no centro da cidade, em uma oficina mecânica. Um lugar movimentado, teoricamente com alto policiamento, mas mesmo assim a morte de Rayane não pode ser evitada.

A jovem Rayane foi morta no centro de Anápolis, em um crime passional que chocou a cidade

No mesmo mês, em 27 de abril, Elvis Greener, que foi cinegrafista do programa policial de TV anapolino 190 Urgente, foi morto nas proximidades do Edifício El Bazi, que fica na rua Floriano Peixoto, região central de Anápolis. Ele foi morto a tiros com uma pistola Glock de cano serrado, o que fez com que a arma funcionasse como uma espécie de metralhadora. Com passagens pela polícia, Elvis Greener pode ter sido morto por reportagens que fez durante a exibição do programa 190 Urgente e que denunciavam vários crimes. Fontes próximas ao rapaz informaram que ele “mexeu com as pessoas erradas”.

Elvis Greener, que tinha passagens pela polícia, foi morto na região central

No dia 7 de maio, duas pessoas foram mortas no bairro Santa Maria de Nazareth, próximo ao campo do Barro Preto. As vítimas estariam conversando na porta de uma residência quando dois indivíduos encapuzados, por volta das 15 horas, chegaram ao local de moto e efetuaram inúmeros disparos de arma de fogo. Naquele dia, Anápolis chegava a 80 homicídios em 2017.

Em um duplo homicídio ocorrido em 31 de maio, dois vigilantes foram encontrados mortos no interior do Juizado da Infância e Juventude de Anápolis. Celso Roberto Tavares, de 34 anos, e Joel Pereira Dutra, de 64, foram executados com um tiro, cada um. A suspeita nesse caso, de acordo com a Polícia, é que os criminosos cometeram o crime para roubar a arma de fogo dos vigilantes.

Fim de semana

Em agosto ocorreu o final de semana mais sangrento do ano. Anápolis registrou entre a madrugada de sexta-feira, dia 11, até à noite do domingo, 13, cinco homicídios e outros dois casos de tentativa de homicídio. E um dos últimos casos “chocantes” em Anápolis, pelas circunstâncias e por se tratar de pessoa conhecida na cidade, foi do médico veterinário João Paulo Alarcão.

O médico veterinário João Paulo Alarcão, foi morto durante um assalto nas proximidades da Avenida JK

No dia 7 de outubro deste ano, nas proximidades do trevo que faz saída para Brasília e Goiânia pela Avenida JK, João Paulo Alarcão, médico veterinário, foi morto a tiros. Ele estava em sua caminhonete, em companhia dos pais.

Centro 6
Vila Jaiara 5
Zona Rural 5
Calixtolândia 4
Frei Eustáquio 4
Jardim Arco Verde 4
Jardim Esperança 4
Jundiai 4
Residencial Copa Cabana 4
Vila Santa Isabel 4
Vila São Joaquim 4
De Lourdes 3
Jardim Calixto 3
São João 3
São Lourenço 3
Vila Esperança 3
Vila João Luiz de Oliveira 3
Boa Vista 2
Chácaras Americanas 2
Conjunto IAP 2
Jardim das Oliveiras 2
Jardim dos Ipes 2
JK Setor Oeste 2
Paraíso 2
Parque Residencial Ander 2
Parque Residencial das Flores 2
Recanto do Sol 2
Residencial Vale do Sol I Etapa 2
São José 2
Setor Industrial Aeroporto 2
Vila Formosa 2
Vila Santa Maria de Nazareth 2
Vivian Parque 2
Adriana Parque 1
Alto da Bela Vista 1
Andracel Center 1
Bandeiras 1
Calixtópolis 1
Campos Elísios 1
Conjunto Filostro Machado 1
Daia 1
Goialândia 1
Gran ville 1
Jardim Alvorada 1
Jardim América 1
Jardim Arco Iris 1
Jardim Eldorado 1
Jardim Goiano 1
Jardim Italia 1
Jardim Petropolis 1
Jardim Promissão 1
Jardim Santa Cecilia 1
Jardim São Paulo 1
JK Parque Industrial Nova Capital 1
Maracanã 1
Maracananzinho 1
Nova Vila Jaiara 1
Novo Jundiaí 1
Parque Brasília 1
Parque das Nações 1
Parque dos Pirineus 1
Residencial Aldeia dos Sonhos 1
Residencial Itatiaia 1
Residencial Itororó 1
Residencial Monte Sinai 1
Residencial Rio Jordão 1
Residencial Santo Expedito 1
Santo André 1
Santos Dumont 1
Setor Bouganville 1
Setor Industrial Munir Calixto 1
Setor Sul I etapa 1
Vila Calixto Abrahão 1
Vila Mariana 1
Vila Santa Maria 1
Vila Vera Cruz 1

Tabela mostra ocorrências de homicídios por bairros

Números da Violência, segundo as estatísticas da Polícia Civil

(até outubro)

141 homicídios

52% das mortes são de pessoas com menos de 30 anos

40% somente dos homicídios são solucionados pela polícia

60 pessoas foram presas

712 atendimentos no Huana por lesão por arma de fogo

508 atendimentos de lesão por arma branca (faca, por exemplo)

 

 

 

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