O Urubu Interior

Henrique Morgantini

Em entrevista concedida a uma emissora de rádio na última semana, o prefeito de Anápolis, Roberto Naves, saiu-se com uma frase que é, no mínimo, curiosa. Diz o prefeito que a oposição é feita em parte por “urubus de plantão”, que são pessoas ou grupos que torcem para tudo dar errado, que ficam de olho em sua gestão como um exemplar da tal ave. E mais: que os tais “abutres do mundo novo” ao fazerem isto torcem, também, contra a cidade.

A afirmação é, de cara, interessante porque o animal escolhido na analogia zoomórfica do prefeito é um Urubu. Ao classificar a oposição de “urubu”, ele automaticamente dá a chancela de carniça à sua gestão até aqui. Afinal, os urubus não se alimentam de outra coisa, se não de animais e frutas em decomposição.

Isto é o Freud chama de “Ato Falho”.

Mas há, ainda, outros pontos curiosos na declaração: a intolerância à oposição. Quem não concorda com os desmandos e atos confusos do líder do Executivo e seu grupo de secretários torna-se um “urubu de plantão”. Milôr Fernandes dizia que “jornalismo é oposição, o resto é armazém de secos e molhados”.

Roberto Naves espera que todos os envolvidos em política – da imprensa aos demais agentes públicos – se comportem como itens de um grande armazém de secos e molhados. Por enquanto, só alguns tem sido assim. E começa a sair cada vez mais caro. Para os dois lados.

Por fim, é imprescindível que o prefeito identifique onde estão os urubus, de fato. Se estão de fora, olhando a putrefação ocorrer e “torcendo” para que o animal vivo vire carniça e possa se tornar alimento, ou se o grande problema até o agora são os “urubus interiores”, ou seja, aqueles que, de dentro para fora, vem fazendo tudo dar errado.

Afinal, não foi um opositor político que cortou as gratificações e horas-extras dos servidores, depois de prometer o contrário em campanha.

Não foi um urubu-de-cabeça-preta quem nomeou assessor especial um indivíduo três vezes delatado por fraudes em licitação na cidade de Campinaçu, conforme documentos do Ministério Público de Goiás.

Não foi um urubu-branco quem nomeou um secretário com carteira vencida para tomar conta do trânsito, ou outro que é acusado de agredir a socos e unhadas um empresário dentro de autarquia pública. E que, por sinal, até o momento, ficou por isto mesmo.

Não é, certamente, um abutre do novo mundo que vem derrapando numa gestão em tempo recorde.

O Prefeito Roberto Naves precisa entender que ele não é a cidade, ele não é a população, e que este Absolutismo de Luiz XIV tem levado muita gente ao buraco há anos e Anápolis é um poço destes exemplos. Torcer pela cidade não é torcer para que os desmandos deem certo, nem mesmo compactuar com o errado. Torcer pela cidade jamais deve ser acobertar absurdos como os citados acima.

A gestão de Anápolis precisa se preocupar com a peçonha que a deteriora de dentro para fora. E só então compreender que urubus não voam em cima de carne viva e boa.

Henrique Morgantini é jornalista e editor-geral de A Voz de Anápolis

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