Síndrome de Burnout: quando a mente e o corpo chegam ao limite

Para quem sofre deste mal, trabalhar e exercer qualquer função, remunerada ou não, pode se tornar um pesadelo: esgotamento físico e mental, estresse, irritabilidade, despersonalização, isolamento e dificuldade de concentração estão entre os sintomas

Felipe Homsi

Um indivíduo chega ao cartório todos os dias pontualmente às 07h55. Após bater o ponto às 08h00, começa a trabalhar. Sua função? Bater carimbos em documentos. E desde que chegou àquele local, ele passou a ser o melhor carimbador, mais rápido e mais assertivo. Ao perceberem que ele é tão bom no que faz, seus colegas passaram a deixar sobre sua mesa duas, três, quatro, cinco vezes mais papeis do que deixavam para qualquer outro no mesmo cargo antes de sua chegada.

Só que, um dia, este sujeito surta. Aparentemente “do nada” deixa de ter uma boa relação profissional, deixa de ter o esmero pessoal e profissional de sempre.  A máquina humana simplesmente… para.

Este é o relato que se encaixa na Síndrome de Burnout, ou Síndrome do Esgotamento, é uma espécie de “combustão”, se for usado o sentido literal do nome em inglês.

O indivíduo acometido por este mal pode perder o prazer e motivação no exercício de suas atividades diárias e apresentar irritabilidade excessiva. Mudanças bruscas de humor, isolamento, dificuldade de concentração, lapsos de memória, ansiedade, depressão, baixa autoestima e pessimismo vêm juntos para piorar o cenário psíquico e físico.

Para o psiquiatra Daniel Victor Arantes, Burnout “é uma síndrome com características psicológicas e comportamentais”. O eixo dessa síndrome são três sintomas: é uma sensação de uma exaustão emocional. O paciente também apresenta uma sensação de despersonalização, como se ele fosse reduzindo o ‘eu’, como se ele fosse funcionando como um protocolo. As características essenciais, que diferenciam uma pessoa da outra, os hobbies, as vontades, os desejos, isso vai se esvanecendo.

O médico psiquiatra Daniel Arantes explica que a Burnout “é uma síndrome com características psicológicas e comportamentais”

“O que vai prevalecendo é como se fosse seguir um protocolo. E a terceira característica é a sensação de que o trabalho que a pessoa desempenha, a funcionalidade da pessoa é muito prejudicada”, resume.

E estes sintomas podem não se resumir ao mercado de trabalho, mas a qualquer atividade em que a pessoa exerça uma funcionalidade, como trabalhos voluntários. A intensidade do trabalho ou a quantidade de horas trabalhadas podem se relacionar com a Síndrome de Burnout, mas não necessariamente são fatores essenciais para que esta condição de saúde se desenvolva. “A diferença é a pessoa desempenhar aquelas horas em uma perspectiva negativa, com tensão, com estresse, com a sensação de estar fazendo algo que não é da vontade dela, ou que ela não está conseguindo resolver aquilo como deveria. É um conceito que é diferente de estresse e é diferente de depressão. É uma síndrome específica”, explicou o psiquiatra Daniel Arantes.

Origens

A atividade exercida não precisa ser remunerada para que a síndrome se desenvolva e é por isso que para entender o quadro geral existe a necessidade de enxergar o paciente sob a ótica funcional. E o problema pode ter suas raízes ainda na adolescência, quando muitos escolhem a profissão que irão desempenhar por toda a vida. É possível imaginar um filho que quer estudar Filosofia, mas se sente pressionado pelos pais a fazer Medicina. Após anos como médico, o desgaste natural da profissão, aliado à frustração, pode levar à Síndrome de Burnout, mesmo que não instantaneamente.

“Essa síndrome ocorre principalmente em médicos e doutores”, explica o psiquiatra. A exigência e a cobrança são ingredientes a mais para que o estado de saúde se deteriore ainda mais. “Aquele trabalho consome a pessoa emocionalmente e consome também a autoestima da pessoa em relação àquela função que está sendo desempenhada”, acrescentou.

Tratamentos

Para diferenciar depressão e Burnout, é preciso identificar que “na depressão, a perspectiva da pessoa em relação à vida, como um todo, está reduzida. A pessoa tem falta de energia, a pessoa tem prejuízos cognitivos importantes, alteração do padrão de sono, podendo dormir mais ou menos, alteração do apetite, onde a pessoa pode comer mais ou menos, e não necessariamente o quadro clínico ‘desgaste emocional’ da pessoa”. Na depressão, o quadro é essencialmente físico, diferentemente do Burnout.

A experiência negativa de frustração, no caso dos pacientes de Burnout, pode ser tratada, com tratamento psiquiátrico ou terapêutico. As abordagens podem incluir medicamentos, no caso de quadros de saúde associados – depressão, ansiedade, transtorno afetivo bipolar e as demais chamadas comorbidades. Mas as principais terapias direcionadas ao paciente de Burnout podem ser as psicoterapias cognitivo-comportamentais, que poderão dar um direcionamento ao para que ele “seja psicoeducado” do ponto de vista funcional.

O objetivo é ajudar o indivíduo a entender sua própria vida, seu comportamento e adotar uma postura diferente em seu cotidiano, minimizando a Burnout. Mudar de trabalho também pode ser uma orientação para os casos de Síndrome de Burnout. As terapias podem buscar um caminho para que o paciente deixe a burocracia de lado e enxergue positivamente seu trabalho e demais atividades diárias. Em casos extremos, a pessoa pode ser aconselhada a planejar sua vida profissional de maneira a buscar mais a satisfação pessoal e menos o sucesso financeiro, já que trabalhar em atividades bem remuneradas não necessariamente significa boa saúde física e psicológica.

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