“Temer prevaricou: isto seria crime de responsabilidade”

Na última quinta-feira (25), a Ordem dos Advogados do Brasil protocolou o pedido de impeachment contra o Presidente Michel Temer. A alegação é que o peemedebista teria cometido crime de prevaricação, de acordo com o presidente da OAB, Claudio Lamachia. “Eu, se sei que alguém é um delinquente, eu não recebo aqui na OAB. Eu não vou receber alguém que sabidamente é um delinquente e um fanfarrão em uma audiência na ordem, quiçá na minha casa, na minha residência, na garagem, no porão, seja o que for”, destacou Claudio Lamachia sobre o fato de Temer não ter feito nada sobre o que Joesley Batista fala em encontro com o chefe do Executivo Nacional.

Gostaria que o senhor esclarecesse a avaliação da OAB sobre o pedido e avaliação dos trechos das conversas gravadas. Onde a OAB encontrou impropriedade e crime de responsabilidade?

Claudio Lamachia – Primeiro, muito se discute sobre a validade da gravação, eventuais interrupções ou edições do áudio. Nós não fazemos uma avaliação sobre isso neste momento. Porque a peça da OAB e a decisão que foi tomada pela Ordem dos Advogados do Brasil tem como base as declarações do próprio presidente da República. O presidente da República, em momento algum, nega os fatos e nega a interlocução que teve. E, portanto, mesmo que o áudio pudesse ter alguma edição, as próprias manifestações e as duas declarações formais do presidente da República reconhecem o teor do diálogo que ele teve com o empresário. Isto que é indiscutível, isto que é hoje confirmado pelo próprio interlocutor. Portanto, estamos produzindo e a decisão do Conselho Federal da Ordem levou muito mais em consideração o fato de o presidente ter escutado tudo o que escutou e confirmado tudo o que escutou e não ter feito nada em relação a isto, não ter tomado uma atitude com relação a isto, do que propriamente o desdobramento e o conteúdo integral do próprio áudio.

Isso seria prevaricação na análise da OAB?

Claudio Lamachia – Prevaricação, isso seria crime de responsabilidade com base na própria Constituição e foi esta a decisão tomada pelo pleno. É importante esclarecer que esta decisão tomada pelo pleno do Conselho Federal foi tomada não apenas por 25 votos a 1. Ela foi tomada por 25 bancadas, compostas cada bancada por três conselheiros federais da OAB, contra uma bancada composta também por três conselheiros federais. Portanto, nós temos 25 bancadas, com três conselheiros federais cada uma representando as 27 seccionais do Brasil. Muitas delas, ainda antes dos seus conselheiros federais, que são os representantes, juntamente com os presidentes das seccionais, tiveram reuniões nos estados antes de virem ao Conselho Federal. Aliás, exatamente o mesmo procedimento que tivemos quando a Ordem dos Advogados do Brasil primeiro avaliou, e depois votou o afastamento, pelo pedido de impedimento, da ex-presidente Dilma Rousseff também. Ou seja, situações que guardam perfeita simetria.

O presidente Michel Temer diz que não tomou nenhuma atitude por considerar que era uma mentira o que o delator relatava para ele naquele momento. Isso muda de alguma forma a avaliação dos senhores?

Claudio Lamachia – Não muda por aquilo que disse. Na medida em que o senhor presidente da República diz que “este empresário é um fanfarrão” que ele não levou em consideração porque tinha esta condição de empresário, de ser um fanfarrão, de ser um delinquente e o presidente não teria tomado nenhuma atitude com relação a isto, me parece mais uma situação que agrava efetivamente o fato. Porque se o presidente da República sabia que nós estávamos diante de um interlocutor que era um “fanfarrão” e um “delinquente”, primeiro o presidente não deveria nem ter recebido. Eu, se sei que alguém é um delinquente, eu não recebo aqui na OAB. Eu não vou receber alguém que sabidamente é um delinquente e um fanfarrão em uma audiência na ordem, quiçá na minha casa, na minha residência, na garagem, no porão, seja o que for.

Nestes dois trechos, qual seria a postura ideal do presidente? No primeiro trecho, onde Joesley Batista diz que tinha a seu favor juízes e um procurador. O que o presidente deveria ter feito neste momento? E no outro trecho também, onde o empresário pede que seja possível usar o nome do presidente para exercer uma influência junto ao CADE?

Claudio Lamachia – No primeiro, na minha avaliação, o mínimo que o presidente deveria ter feito encerrar a conversa e comunicar as autoridades competentes. No segundo, o presidente jamais deveria indicar um interlocutor para um fanfarrão ou para alguém que é um delinquente.

O STF vai avaliar o áudio e decidir sobre o inquérito. Se o inquérito tiver uma decisão contrária no STF, como fica o pedido de impeachment da OAB?

Claudio Lamachia – Mais uma vez, para a OAB o ponto central não é se o áudio teve ou não edição. Eu não estou dizendo que houve. Mas nós não levamos em consideração o áudio. A ordem tem o áudio dentro de um contexto. Mas o conselho da OAB levou em conta as manifestações do presidente, que não nega o conteúdo da conversa ou desqualifica o que foi dito. Desqualifica o interlocutor, mas não o que foi dito. Isto confirma a veracidade do que foi colocado.

O que o senhor considera mais grave naquele diálogo todo?

Claudio Lamachia – Eu digo a vocês que tudo ali é gravíssimo. Todas as colocações feitas, o conteúdo integral da conversa é gravíssimo. Se em algum ponto não estiver correto e ficar confirmado que foi objeto de manipulação, o presidente da República não está sendo acusado pela OAB. A OAB não está protocolando um pedido que seja uma sentença. A OAB está protocolando um pedido com base nos elementos aos quais vocês tiveram acesso e o presidente da República terá toda condição de exercer o seu livre exercício do direito de defesa, contraditório e nós estaremos defendendo o devido processo legal, para que o presidente possa produzir a sua defesa. Agora, os fatos que estão postos ali, e o posicionamento do presidente nas entrevistas que deu, nos dois pronunciamentos à nação que foram feitos pelo presidente, em momento algum o presidente afirmou que não tinha tido o diálogo. Quando o presidente diz que não levou em conta o que o interlocutor diz, porque a pessoa é um “fanfarrão”, um “delinquente”, nós podemos ver que não é uma fantasia, tanto é que temos membro do Ministério Público que foi relatado ao presidente, que estava comprado. Ele está preso hoje. O membro do Ministério Público está preso por força daquele episódio. Ou seja, não é um episódio que se possa dizer que seja fantasioso.

A liderança do governo no Congresso Nacional afirma que o presidente Rodrigo Maia não vai aceitar nenhum pedido de impeachment. A OAB pretende também fazer algo para que este pedido seja avaliado, diante da recusa da Câmara em montar esta comissão de impeachment?

Claudio Lamachia – Primeiro, com relação ao presidente da Câmara. A prerrogativa de dar seguimento ou não ao pedido de impeachment é do presidente da Câmara. Quem tem prerrogativas, tem responsabilidades. Se ele descumprir suas prerrogativas, quem tem que julgar são os seus eleitores. Quanto a OAB tomar uma atitude judicial com relação a isso, é algo para o segundo momento. Eu tenho procurado focar em questões pontuais, porque a responsabilidade é muito grande.

De qualquer forma, a aceitação do processo na Câmara é um movimento político. Neste caso, a OAB pretende se integrar ao movimento de rua ou político para que haja aceitação deste processo? A OAB acredita que deve ser seguida a constituição ou deve ser estabelecida uma proposta de ementa à constituição para antecipação das eleições?

Claudio Lamachia – Primeiro, com relação a integrar-se ou não aos movimentos. Isto não é uma situação definida na OAB. Estamos avaliando. Os dirigentes da OAB estão avaliando. Eu tenho defendido muito a pacificação no Brasil. O Brasil precisa de mais tolerância, menos arrogância. O que ocorre hoje não faz bem para o Brasil. A OAB é a maior instituição de membros do sistema jurídico. Temos que manter esta serenidade. Uma outra questão. A Constituição Federal tem que ser cumprida. Qualquer alteração fora da constituição não tem e não terá o apoio da Ordem dos Advogados do brasil. Qualquer solução que esteja fora dos termos da Constituição que traga ruptura constitucional não terá o apoio da OAB. Não significa dizer que a OAB não possa debater a até mesmo eventualmente apoiar a PEC para as eleições diretas, no caso de vacância do cargo de presidente da República, até seis meses antes do final do mandato, desde que isto não seja considerado uma ruptura constitucional. Portanto, a Ordem vai também debater isso. Nós não estamos fechados a qualquer tipo de debate.

No ano passado, a OAB apoiou a cassação do Delcídio e do Cunha. A OAB vai fazer o mesmo com o Aécio?

Claudio Lamachia – Sem Dúvidas. Acho que o processo no Senado tem que ser instalado imediatamente. Seria um sinal muito ruim um eventual retomada do senador Aécio Neves. São gravíssimos os fatos que dizem respeito a ele e as explicações não são satisfatórias. Em respeito à instituição Senado Federal, ele deveria ser o primeiro a pedir seu afastamento. Agora, eu defendo o devido processo legal no âmbito do Senado Federal, que ele seja julgado pela comissão de ética no Senado Federal. Mas estou dizendo que entendo que ele deveria ser o primeiro a pedir seu afastamento. Produza sua defesa, nós vivemos em um estado democrático de direito. Mas os fatos imputados ao senador Aécio Neves são gravíssimos.

O fato de a presidência ter solicitado ao gabinete de segurança institucional a perícia no áudio tem alguma implicação?

Claudio Lamachia – É algo que merece uma reflexão, mas nós temos tantos outros fatos tão graves. Acho que o presidente tem o direito de ter sua estrutura para avaliar se houve uma montagem contra o presidente da República. Mas teríamos que refletir um pouco melhor.

Quero que o senhor explique melhor a possibilidade de a OAB dar apoio a uma PEC promovendo novas eleições.

Claudio Lamachia – No mesmo formato que tudo que temos feitos. Temos regras próprias para isso. Temos que chamar o conselho federal da ordem para que o conselho federal da OAB fizesse uma apreciação sobe esta PEC ou sobre estes temas. A pauta é minha, do presidente da OAB e eu vou avaliar os pontos mais importantes para a OAB defender neste momento.

De acordo com o senhor, o presidente teria prevaricado. É isso que baseia a sua afirmação de que ele cometeu crime de responsabilidade?

Claudio Lamachia – Também. Isto está sendo elaborado na peça. Nós nos cumprimentamos a entregar a argumentação técnica.

O fato de o presidente Temer não ter negado o conteúdo das conversas, significa que ele não esteja fazendo uma defesa?

Esta pergunta tem que ser feita ao presidente da República. Eu não sei o que se passa na cabeça do presidente da República.

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