Anapolinos ainda usam os chamados “orelhões”?

Tão fundamentais num passado recente, as unidades telefônicas públicas tornam-se um monumento ao passado e são cada vez menos usadas, passando quase que despercebidas em vários pontos da cidade

Paulo Roberto Belém

Pergunta rápida: busque na memória a última vez e em qual situação você, leitor, utilizou de um telefone público. Pensou? Se a sua resposta for “não me lembro”, não se preocupe. Esta é a resposta padrão que demonstra uma realidade: nas cidades mais estruturadas, cada vez menos, os chamados orelhões têm sido utilizados e os aparelhos passam quase que despercebidos. Se há 10 anos, onde se tinha um telefone público era possível ver alguém se utilizando dele, hoje, não mais. Eles chegam a ficar dias e dias sem que alguém os procure.

A realidade foi aferida por A Voz de Anápolis. Em um lugar com grande circulação de pessoas no centro da cidade, em um intervalo de uma hora de um dia útil, a reportagem não conseguiu flagrar nenhum cidadão utilizando um dos dois telefones públicos instalados na Praça Gomes de Souza Ramos. Quem acompanhou a vigília foi o ambulante José Nunes. Ele tem o seu carrinho estacionado bem ao lado dos dois aparelhos. “Vocês vão ficar cansados de esperar”, disse.

Rotina

Para o ambulante que trabalha em todos os dias da semana no mesmo local, os aparelhos já não têm mais utilidade como antes. “Estão aqui de enfeite”, comentou. Ele contou que a última vez que viu alguém utilizar um dos orelhões foi em uma emergência. “Uma senhora chegou aqui se queixando da bateria do celular que tinha acabado. Eu acho que as pessoas só buscam o orelhão nessas emergências”, acredita.

Para o ambulante José Nunes, aparelhos não tem tanta utilidade quanto antes. “Estão aqui de enfeite”, comentou

Em toda a cidade, a situação é a mesma. Telefones públicos instalados, mas ninguém os utilizando. Na Avenida São Francisco, no Jundiaí, o telefone estava lá, bem ao lado de uma agência lotérica. Pessoas, só na lotérica. Já o telefone, seguia ali, “sem utilidade”. O mesmo foi observado em outra rua do centro da cidade. Os orelhões figuram na paisagem da via movimentada, mas nada de alguém solicitá-los.

Na Avenida São Francisco, pessoas, só na lotérica. Já o telefone, segue ali, “sem utilidade”

Celular

Em um dos locais onde telefones públicos são facilmente encontrados, no Terminal Rodoviário, a comerciante Sirlene Domingos tem uma banca de roupas, bem ao lado de um dos aparelhos instalados no espaço. Ela disse que mesmo estando em um local de grande movimentação de pessoas, o telefone passa despercebido. “O telefone fica aí e ninguém usa”, comentou.

Para a comerciante Sirlene Domingos, causa do abandono dos orelhões é o uso do celular

A comerciante acredita que a causa do abandono dos orelhões é o uso do celular. “Para que orelhão se tem celular?”, indaga. Ela entende que se a pessoa tem um aparelho de telefonia móvel, ela vai optar por essa facilidade. “Hoje em dia está tão barato manter um celular que faz com que o orelhão seja substituído pela telefonia móvel”, pontuou. Mesmo assim, a comerciante diz que os aparelhos ainda têm uma função. “Tem gente que não tem celular. Eu acho que mesmo o serviço sendo utilizado pouco, é algo que tem que ter”, declarou.

Aparelhos figuram na paisagem do espaço da Prefeitura

 

“Passo semanas sem vender créditos”, revela comerciante

Outro dado importante que demonstra a situação do uso dos orelhões está no que revela o comerciante Gustavo Oliveira. Ele trabalha com a família em uma banca de revistas do centro da cidade que comercializa os cartões de crédito para o uso do telefone público. Ele comentou sobre a procura do produto. “Muito esporádica. Tem semana que eu chego a vender um cartão”, revela.

O comerciante Gustavo Oliveira afirma que venda de cartões de crédito para orelhão é esporádica

Para o jovem, o abandono dos orelhões é causado pela mudança de um hábito cultural. “Acaba que eles (os telefones) não têm muita utilidade por conta disso. Estamos na era dos smartphones”, ponderou. Diferente da maioria das pessoas, ela até se recorda da última vez em que utilizou o aparelho. “Acho que faz uns seis anos”, lembrou, citando as situações que ele acredita que os orelhões são procurados. “Quando a bateria do celular acaba, quando o celular estraga, quando não se tem nenhuma alternativa”, comentou.

Orelhões figuram na paisagem da via movimentada do centro da cidade, mas nada de alguém solicitá-los

Operadora não fala em extinção, mas reclama do vandalismo

A empresa Oi, que mantém o funcionamento dos telefones públicos de Goiás desde 2008, respondeu, em nota, que Anápolis tem, atualmente, um total de 1,4 mil orelhões instalados na cidade. A operadora reconhece que a chegada da telefonia móvel fez com que os telefones públicos ficassem menos atrativos, mas entende que essa migração fez parte da evolução da telefonia em todo o mundo. Segundo a empresa, apenas 0,04% dos telefones públicos da Oi gera receita suficiente para o pagamento do seu próprio custo de manutenção. “Hoje, 68,2% dos orelhões da Oi não geram chamadas tarifadas e 29,9% não são sequer utilizados”, afirmou a empresa.

A Oi descarta a possibilidade de extinção do serviço por conta desses quantitativos, mas reclama do vandalismo que os aparelhos sofrem. De acordo com a empresa, o fato da maioria dos orelhões estarem instalados em vias e estabelecimentos públicos faz com que os aparelhos sofram, diariamente, danos por vandalismo.

A empresa afirma, ainda, que atende a regulamentações da Agência Nacional das Telecomunicações – Anatel, mas que disposição dos orelhões pode ser readaptada. “Se for verificada ociosidade de determinados telefones públicos, eles podem ser transferidos para áreas de maior demanda”, finalizou.

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