Vilma Rodrigues: “Em meu mandato, vou nadar contra a corrente se necessário for”

Felipe Homsi, Henrique Morgantini e Paulo Roberto Belém

Das funções básicas que um vereador pode assumir, como fiscalizar e propor leis, para Vilma Rodrigues, a atenção ao ser humano deve ser o trabalho essencial. Em seu primeiro mandato e com a segunda maior votação no último pleito, a edil trabalha para que questões sociais, como o direito dos idosos e das pessoas com câncer, sejam colocadas como pautas principais dos processos que tramitam na Casa. Seu discurso enfático em defesa dos direitos humanos e pela inclusão social já levou colegas seus a lhe darem o famoso “puxão de orelha”, segundo relata. Mas, ainda de acordo com Vilma, isto não a intimida. Ela garante: não vai parar de falar e defender os principais interessados pelo seu trabalho.

A Voz de Anápolis – A senhora faz parte de uma nova leva de vereadores, que promoveu uma renovação na Câmara. Passados seis meses, qual é a avaliação do seu trabalho?

Vilma Rodrigues – Em tudo na vida, a expectativa é maior que o contexto. Eu tinha uma expectativa, eu sabia como funcionava a política, eu sempre soube. Meu pai era político. Embora eu morasse na zona rural, fosse trabalhador rural, ele era político. A política bem desenvolvida é maravilhosa, é onde você consegue os meios necessários para chegar às pessoas que precisam. Eu nunca pensei em ser política, eu tinha raiva de ser política. Porque meu pai tinha um quartel político, onde as pessoas iam pegar um pé de botina para depois pegar o outro. Iam pegar o cabo da enxada para depois pegar o resto. Meu pai montava um quartel no Pau-Terra com os candidatos dele. Então eu não gostava de política. Mas eu precisava ajudar as pessoas e ajudar ao meu filho [o delegado Manoel Vanderic, que está à frente da Delegacia de Proteção ao Idoso] em seu trabalho de ajudar as pessoas. Às vezes bastava vontade política, mas não havia essa vontade. E isso frustrava muito a gente. Filiei ao PSC e fizemos a campanha, eu e ele (seu filho).

AVA – Nesses seis meses, deu para a senhora entender que isto é possível através da atuação da Câmara Municipal?

VR – É possível. Não do jeito que eu pensava, porque tudo você vai adaptando com o meio, porque todas as pessoas têm os seus próprios interesses, suas próprias vaidades. E aqui eu te falo, olhando para você de todo coração: eu não tenho essa vaidade. Eu tenho um projeto que eu ia fazer e a pessoa falou: “mas você fez esse projeto, isso era ideia minha”. Eu falei: “eu fico feliz, eu passo para você, porque eu já vou cuidar de outra coisa”. Eu não tenho essa vaidade de que tudo eu tenho que fazer, eu tenho que aparecer, porque eu passei dessa idade. A idade da vaidade, eu passei dela.

AVA – Em dois momentos na Câmara, a senhora precisou chamar a atenção dos vereadores para algo que em tese eles deveriam estar engajados: a ajuda de pessoas doentes e desamparadas. As pessoas estão distantes da causa humanitária?

VR – Fico muito triste por saber que existem pessoas com este perfil. Mas quando você se depara com ela, é pior. Eu fui chamada por dois vereadores. Sempre que eu questiono algo, eu sou chamada para um “puxão de orelha”.

AVA – Por quem?

VR – Vereadores, em especial dois deles: “olha, você não pode dizer isso ou aquilo”. Porque eu tenho um projeto, eu queria que ele fosse a plenário neste primeiro semestre, não consegui. Porque ele está preso à empresa de ônibus Urban. Eu defendo o passe livre para pessoas extremamente carentes. Temos nesta comissão pessoas idôneas, que representam os interessados, pessoas com credibilidade. E mesmo assim é questionado. A Urban usa de meios para indeferir todos os processos, de pessoas que tinham o passe livre há dez anos (ou mais). Ninguém anda de ônibus para passear, não é bom você passear de ônibus, você usa quando precisa mesmo. Eu tenho um projeto de lei neste sentido que tramita na Câmara e eu perdi a esperança que ele vá à votação neste primeiro semestre, mas eu tenho muita esperança, porque o bom desta câmara municipal é que 90% são de pessoas bem intencionadas, que querem o bem da população. Você querer 100% é querer muito.

AVA – Mas eles não estão lá para isso?

VR – Queria que as pessoas fossem esclarecidas a esse ponto, mas não são todos. Eu falei no plenário que os vereadores podem votar contra, mas a população tem o direito de saber quem votou contra. Eu fui além porque eu sou bocuda. Meu filho falou: “mãe, toma cuidado com o anzol, porque se você morder morre”. Eu falei que quem votar contra vou colocar um outdoor com as fotos de quem foi contra ou a favor. A pessoa tem que assumir seus atos, principalmente a pessoa pública, que tem que saber que seus atos têm consequências na ponta.

AVA – Essa posição de independência tem gerado os puxões de orelha, as pequenas represálias?

VR – Eu creio que sim, porque eu falei na semana passada em plenário. Saí e recebi um puxão de orelha na câmara, porque eu não saio de lá. Eu falei: não devo nada para o prefeito, a nenhum dos vereadores.

AVA – Quanto ao passe livre, a maioria está disposta a ir a favor dos mais necessitados?

VR – Hoje eu não tenho essa certeza, porque a Urban passou em todos os gabinetes, menos dos cinco que são do nosso grupo.

AVA – Quais são esses cinco?

VR – Eu, a Thais[Sousa, vice presidente], o Lélio [Alvarenga], o Japão [Deusmar] e o Leandro [Ribeiro]. Nós procuramos essa união para conseguirmos alguma coisa. Porque cinco é o fiel da balança.

AVA – Depois desta visita da Urban, houve mudanças? O projeto perdeu a força?

VR – Eu senti que está balançado. Houve, sim. E isso me levou a falar isso. Quando eu fiquei sabendo, eu subi na tribuna e falei: “olha, o prefeito não votou em mim, nenhum vereador votou em mim, nem nunca vai votar. As pessoas que votaram em mim estão esperando essa posição minha.

AVA – Havia três pessoas falando muito da Urban: a senhora, o vereador Domingos Paula e o vereador Mauro Severiano. A impressão que dá é que só a senhora ficou com este discurso. É isso?

VR – Lamentavelmente. Mas eu vou falar para você: Quando você está em um rio e afunda um barco que tem cem pessoas, você vai nadando, olha para trás e não tem ninguém nadando, você continua tentando chegar à margem do rio. E é isso que vou tentar fazer com meu mandato. Vou nadar contra a correnteza se necessário for.

AVA – Você acha que vai sofrer ou já está sofrendo retaliações?

VR – Eu não digo retaliações, mas aquele tipo que às vezes você tem como se fosse um conselho. “Olha, não faz isso, porque não vai adiantar, você é novata, você ainda vai aprender muito na política”. Eu falo: “gente, eu não sou novata, eu sou velhaca (risos).

AVA – E esse tipo de lição da política: a senhora quer aprender com quem lhe aconselha?

VR – Não, de coração. Eu dou graças a Deus porque hoje eu posso olhar todo mundo no olho. E Deus tem me abençoado tanto. Porque a aprovação de uma novata de dois projetos extremamente importantes, como é o do câncer, que garante 60 dias para o diagnóstico e como foi também o da creche do idoso. Não foi uma vitória minha e eu vou ressaltar aqui: a imprensa de Anápolis tem uma influência muito grande. Se a imprensa estiver do seu lado – eu creio que quem mexe com rádio e jornal são pessoas do bem, que estão ao lado da população, que querem ver as coisas darem certo, que torcem para que dê certo e que sabem que um dia terão que prestar conta.

AVA – Esses projetos também precisam ter o aval do Executivo. Como tem sido a relação entre a vereadora Vilma Rodrigues e o prefeito Roberto Naves?

VR – Eu tenho que ser justa. O projeto da creche do idoso só deu certo porque o prefeito abraçou. E existe uma emenda – dos R$ 10 milhões que o governador está direcionando para Anápolis, R$ 500 mil vão para a creche. E no dia da votação, o que foi fundamental? Foi que o prefeito pediu que o assessor direto dele, o representante direto dele na Câmara (vereador Jakson Charles) fosse a plenário e dissesse a todos os vereadores e presentes que tinha os R$ 500 mil para fazer a creche, a gente não ia mais alugar um imóvel, a gente vai construir. E o prefeito mandou o seguinte recado: “nós temos a emenda do governador de R$ 500 mil, mas se necessário for R$ 600, R$ 700 mil, a Prefeitura não vai parar a obra, nós vamos fazer”.

AVA – O seu projeto em defesa dos idosos atende a uma demanda urgente. Há uma falta de políticas públicas para defender esta causa ou a cidade é atendida com uma rede de proteção ao idoso?

VR – Nós não temos nenhuma. Se não houvesse a Delegacia do Idoso, o idoso estaria totalmente desamparado. A não ser pelos abrigos. Os abrigos acolhem, cuidam, protegem.

AVA – Mas eles recebem o amparo do poder público?

VR – Tem uma pequena ajuda. Mas o idoso que vai para um abrigo recebe a maior sentença de morte, que é o rompimento total do vínculo familiar. O problema da creche para o idoso é que durante a semana o parente leva e busca e depois muitos abandonam o idoso. A perda do vínculo familiar é que mata o idoso.

AVA – A senhora faz parte de um momento histórico em Anápolis, em que as mulheres têm mais espaço nas esferas de poder. Você consegue enxergar isso como avanço, já que a cidade tem agora quatro vereadoras?

VR – A participação da mulher na política é o único remédio. À medida que vai aumentando, a política vai melhorando, a mulher é mais sensível. Não digo que ela é menos corrupta, mas tem uma dificuldade maior de ser corrompida. A responsabilidade dela como mãe, como esposa, como filha é maior. Eu tenho uma alegria é muito grande e minha responsabilidade é maior que a de todas porque eu fui a segunda mais votada. Mas a mulher tem demonstrado na política que é mais sensível aos problemas da população, ela procura e se dedica mais.

AVA – Como está seu trabalho na fiscalização do Poder Executivo?

VR – Eu acho que, pelo momento que estamos vivendo, aumento de taxas é o pior recurso que existe. Saiu agora na Revista Veja que o Brasil bate recordes de impostos. Anápolis não foge a essa regra. Pelo que a população recebe hoje do poder público não se pode pensar em aumentar taxar. Apesar de que a responsabilidade é também da população. Não se pode jogar lixo na porta de casa para o poder público catar. Eu achei nesta semana a cidade suja, muito suja. Está feia. Mas a irresponsabilidade é apenas do poder público? Não. Cada um deve assumir sua parte da responsabilidade. A cidade seria melhor se todos fossem melhores.

AVA – A senhora foi a segunda mais votada e ano que vem tem eleição. Há planos para que a senhora seja candidata à Assembleia Legislativa?

VR – Não. Eu vou te falar de todo o coração: Eu não caminho olhando para cima, eu caminho olhando para frente. Fui eleita para ser vereadora durante quatro anos e a pessoa que confiou seu voto em mim o seu voto por quatro anos, eu vou honrar esse voto. E eu acho que sou mais útil aqui. Eu não sou candidata. Meu filho não é candidato. Isso é certo.

AVA – Cite um ponto positivo e um ponto negativo de seu mandato até aqui.

VR – Um ponto positivo é que através do mandato você consegue abrir portas que você antes não conseguia. Já teve época de eu tentar falar com o prefeito três meses e não ser recebida. Eu já fiquei um ano tentando falar com o prefeito, marcar uma audiência, como cidadã, como pessoa que vai em abrigo e que conhece a situação difícil das pessoas. Não conseguia de jeito nenhum e era uma frustração. Você iria falar para quem que o poder público fechou as portas para você. Hoje não acontece isso. Se eu falar que quero falar com o prefeito hoje, é urgente. Hoje, chegou rindo na prefeitura e ele já ouve de lá de dentro (risos).

AVA – E ponto negativo?

VR – De a gente encontrar tantas dificuldades para que chegue o necessário para as pessoas que precisam. Tem muito tempo que tento coisas tão pequenas, mas porque não temos o apoio, ou por vaidades, não conseguimos.

AVA – No seu grupo?

VR – No grupo da Câmara. Às vezes você insiste, mas as coisas não acontecem. E você fica frustrado. Vou dar um exemplo: há duas semanas compartilhei a foto de meninos em Anápolis com escaras. Um deles morreu. Porque o grupo de assistência da família acabou. Alguns assistentes sociais até faziam os curativos, mas não conseguiram continuar. Com isso tudo, pensei em levar para a Câmara e se for necessário a gente divide, fica barato para cada um dos 23 vereadores pagar um enfermeiro profissional e fazer esses curativos. Porque são somente seis pessoas nessa situação hoje. Mas ninguém se manifestou. Eu acho que talvez tenha sido falha minha, eu quero que você frise isso. Eu não vou colocar essa culpa nos vereadores. Mas não aconteceu nada e o Fernando morreu na última sexta-feira passada.

AVA – No que você falhou?

VR – Talvez eu não tenha sabido colocar o que fosse necessário, talvez eu não tenha pedido isso para os vereadores, eu tenha ficado esperando que fosse oferecido. Então, às vezes houve uma falha minha.

AVA – Se alguém quiser ajudar, o melhor caminho é procurar quem?

VR – A Delegacia do Idoso e a Delegacia da Pessoa com Deficiência. E eu quero colocar aqui que tem anos, desde que foi criada a Delegacia da Pessoa Portadora de Deficiência, que ela não foi regularizada. Ela existe porque as pessoas que lá trabalham fazem o trabalho da delegacia voluntariamente. Porque, como ela não existe, não tem funcionário, não recebe nada, não tem ajuda de nada, porque ela não existe no papel. E o deputado não precisa fazer nada. O projeto está pronto. É só levar para a assembleia e ser votado. A gente mendiga isso há anos. Já passou nas mãos de todos os deputados que a gente possa pensar. E foi guardado, guardado, guardado.

 

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